Skip to main content

Por Sergio Xavier

Para conter o aquecimento planetário, superar misérias e evitar megatragédias climáticas é preciso reverter modelos econômicos baseados em petróleo, desmatamentos, desigualdades e poluições. Formular políticas públicas interconectando todas essas questões é passo urgente. Visão sistêmica é essencial na inadiável regeneração socioecológica, local e global.

O 6º Relatório sobre Mudanças Climáticas (IPCC 2023) reitera indicadores alarmantes. O tempo se esgotou. É emergencial transformar processos degradadores em cadeias regenerativas e inclusivas. Inventar uma economia comprometida em replantar florestas, revitalizar rios, priorizar energias renováveis, zerar lixos, reequilibrar os ciclos naturais do carbono, eliminar desigualdades. Com negócios, empregos e produtos baseados no fortalecimento dos ecossistemas e não na decadência da vida na Terra. Isso exige ecologizar moedas em vez de monetarizar a natureza.

Os Labs de Economia Regenerativa, unindo empresas, ONGs, centros acadêmicos, cooperativas, comunidades e governos (políticas públicas), visam contribuir nesse desafio dramático. O inédito Crédito de Carbono Integral é uma das inovações em estudo.

Diferente do crédito de carbono tradicional, que autoriza o direito de poluir, o crédito de carbono integral soma regeneração de matas nativas, proteção da biodiversidade, inclusão social, impulso à bioeconomia e geração de energia renovável em bases cooperativas. Uma proposta que pode aprimorar a regulação do mercado de carbono, em construção no Brasil.

O Crédito de Carbono Bio-Social-Energético, em criação no Projeto HidroSinergia (parceria do Centro Brasil no Clima – CBC com o Instituto Clima e Sociedade – iCS, o Projeto Nordeste Potência e a pioneira Cooperativa de Crédito de Carbono Social da Caatinga) se diferencia do crédito convencional comercializado pelas empresas para compensar suas emissões de poluentes, interligando múltiplos elementos:

  • Cadeias bioindustriais circulares, políticas públicas e modelos econômicos adaptados às vocações e características de cada bioma, para diminuir gases-estufa, acelerar inclusões e regenerar ecossistemas;
  • Captura de carbono na Caatinga, com base em cooperativas de agricultura familiar – gerando oportunidades da economia verde para redes de pequenos produtores;
  • Pagamentos por Serviços Ambientais pela proteção da biodiversidade – cálculos considerando referências da última COP da Biodiversidade (Canadá, Dez/22);
  • Redes Agro-Solares, usando pequenas usinas solares para gerar energia, captar chuvas e cultivar hortas sob as placas fotovoltaicas, instaladas em estruturas mais elevadas. Energia renovável em cooperativas é caminho para elevar renda, desconcentrar riqueza e empoderar as comunidades mais pobres do ensolarado sertão;
  • Compensação por Perdas e Danos (justiça climática), com base nos conceitos da COP27 (Egito, Nov/22). O semiárido brasileiro é uma das regiões mais impactadas com o aquecimento provocado pelos grandes emissores de gases-estufa.

Excesso de Carbono na atmosfera, provocando aquecimento global e mudanças climáticas, é um macroindicador das desigualdades atuais: problema gerado pelos mais ricos, obtendo muitos lucros, e solução mantendo exclusões, com um tipo de crédito que também só é acessível aos ricos. O Crédito de Carbono Integral, com redes de cooperativas, é uma proposta para corrigir essa grande injustiça do século 21.

É um novo instrumento socioeconômico-ambiental, com visão abrangente, que torna as cooperativas bases de capacitação produtiva e gera dividendos para os investidores na forma de novos Créditos de Carbono, garantindo que o dinheiro real circule na economia regional. Ou seja, um mecanismo que transforma o Carbono em ativo vivo e inclusivo, a impulsionar continuamente a economia local; e não uma receita passiva, atrasando ainda mais o desenvolvimento justo, criativo e sustentável de regiões pobres.

Os investimentos nesse sistema de ecodesenvolvimento serão captados via fundo especializado e aplicados em projetos de cooperativas previamente qualificadas, buscando-se conexões com Blended Finance, Green Bonds, Social Bonds e Sustainability-linked Bonds e outros instrumentos do emergente ecomercado financeiro.

Inicialmente o modelo será testado no mercado voluntário de Carbono, mas pode se tornar uma plataforma da nova economia de descarbono e impulsionar o desenvolvimento regenerativo da Caatinga e de outros biomas.

*Sergio Xavier é diretor executivo do Consórcio Regenerar e articulador dos Labs de Economia Regenerativa no Centro Brasil no Clima (CBC)

Fonte: Valor Econômico – Prática ESG