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*Olga Martins Wehb

O aquecimento global tem se manifestado de forma intensa e alarmante em todo o mundo. Ondas de calor extremo vêm quebrando recordes nos Estados Unidos, Europa e Ásia. Recentemente, a Sicília, na Itália, registrou uma temperatura de 46,3°C, a mais alta já documentada na Europa. Além disso, fenômenos como incêndios florestais na Grécia e nos Alpes suíços, bem como inundações devastadoras na Índia e na Coreia do Sul, são evidências tangíveis das mudanças climáticas.

Nos Estados Unidos, apesar de enfrentamento de temperaturas recordes – como as que superaram 53°C na semana passada no Vale da Morte, na Califórnia, o país persiste na exploração de petróleo no Ártico. Além disso, embora o fenômeno El Niño não seja o principal causador desses eventos extremos, ele tem potencial para intensificar a ocorrência de novos recordes de temperatura. Isso foi evidenciado pela média global de junho de 2023, que alcançou patamares inéditos em diversos países europeus.

A taxa de aquecimento global de 0,18°C por década, observada entre 1970 e 2015, está se tornando obsoleta. Estamos entrando em uma fase de aceleração do aquecimento, com projeções indicando que, nos próximos 25 anos, a taxa de aumento da temperatura pode variar de 0,25°C a 0,32°C por década. Estudos recentes confirmam essa tendência, sugerindo um aumento adicional ao registrado nas últimas décadas.

As ondas de calor extremo pressionam fortemente as populações e os sistemas de saúde, afetando especialmente as populações mais vulneráveis e acarretando um aumento nas hospitalizações e nos custos com saúde. De acordo com o Centro de Progresso Americano, o verão de 2023 poderá gerar cerca de US$ 1 bilhão em despesas de saúde devido à ocorrência de doenças associadas ao calor extremo.

No Brasil, as alterações climáticas também estão causando impacto. Variações climáticas severas afetam todos os aspectos da vida, da saúde à economia. O Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), um órgão do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) e representante do Brasil junto à Organização Meteorológica Mundial (OMM) desde 1950, vem registrando desvios notáveis na média histórica de temperaturas, ressaltando a necessidade urgente de ações climáticas adequadas, tanto local quanto globalmente.

Durante o outono, o país enfrentou uma combinação de chuvas intensas e temperaturas elevadas, atribuídas à presença de massas de ar quente e seco. Em alguns municípios do Rio Grande do Sul, os termômetros chegaram próximos aos 40°C. Contudo, nas regiões Nordeste e Sudeste, as temperaturas se mantiveram de acordo com ou levemente abaixo da média histórica. Em Minas Gerais, as chuvas constantes ajudaram na redução da temperatura local. O balanço completo do outono de 2023 está disponível no site do INMETOnda de calor.

Os impactos do aquecimento global vão além da terra firme; os oceanos estão sendo consideravelmente afetados. As ondas de calor, cada vez mais frequentes e intensas, colocam em risco a vida marinha, as populações costeiras, populações vulneráveis, as atividades pesqueiras e os padrões climáticos. Em junho, as maiores temperaturas da superfície oceânica já documentadas foram registradas, segundo o Copernicus Climate Change Service da União Europeia.

Essas ondas de calor marinhas exercem um impacto devastador nos ecossistemas marinhos, resultando em perda de espécies, branqueamento de corais e uma redução na capacidade de absorção de CO2. Na costa oeste da Austrália, durante o verão de 2010/2011, altas temperaturas levaram à extensa mortalidade de peixes e à destruição de florestas de algas. Em 2016, um El Niño intensificado pelas mudanças climáticas provocou o branqueamento de corais mais severo já registrado na Grande Barreira de Corais. Adicionalmente, a expansão térmica – quando a água aquecida aumenta de volume – combinada com o derretimento das geleiras da Groenlândia e da Antártida, amplifica o risco de inundações costeiras.

Mudanças de curto prazo nos padrões regionais de circulação oceânica e atmosférica podem desencadear períodos de intenso calor marinho. No entanto, o aumento contínuo das temperaturas oceânicas, impulsionado pelo acréscimo nas emissões de gases de efeito estufa, é um fator crucial para as recentes ondas de calor. Pesquisas indicam que cerca de 90% do excesso de calor gerado pela atividade humana é absorvido pelos oceanos, com a taxa de acumulação de calor dobrando nas últimas duas décadas. Segundo um relatório de 2021 do IPCC, a frequência das ondas de calor marinho dobrou desde 1982, tornando-se mais intensas e prolongadas.

Por fim, a urgência de ações concretas para combater as mudanças climáticas é inquestionável. Pesquisas sugerem soluções centradas na natureza para a redução das emissões de carbono, incluindo a restauração de terras degradadas e o reflorestamento em larga escala, além de outras ações possíveis. A necessidade iminente de ação é apenas reforçada pelo alerta da Organização Meteorológica Mundial sobre eventos climáticos extremos se tornando a “nova normalidade”. A luta contra as mudanças climáticas exige esforços coordenados em todos os níveis da sociedade. Governos, empresas e indivíduos precisam se engajar ativamente na busca de menores emissões, conforme estabelecidas nos acordos do IPCC, e práticas mais sustentáveis.

*Olga Martins Wehb é socióloga e consultora sênior do Centro Brasil no Clima.


Fontes de pesquisa

  1. https://diplomatique.org.br/uma-oportunidade-para-salvar-o-planeta/
  2. https://diplomatique.org.br/dando-nome-a-fritura-climatica
  3. https://diplomatique.org.br/estudos-mostram-que-o-aquecimento-global-pode-estar-subestimado/
  4. https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2023/07/atual-onda-de-calor-na-europa-tem-relacao-com-acao-do-homem-e-anticiclone.shtml
  5. https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2022/10/mundo-deve-aumentar-emissoes-de-gases-de-efeito-estufa-em-106-ate-2030.shtml
  6. https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2023/07/a-onda-de-calor-no-mar-que-preocupa-cientistas.shtml
  7. https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2023/07/oceano-atinge-temperatura-de-banheira-de-hidromassagem-na-florida-e-bate-recorde-no-mediterraneo.shtml
  8. https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2023/04/mudancas-climaticas-o-rapido-e-recente-aquecimento-dos-oceanos-que-alarma-cientistas.shtml
  9. https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2023/07/18/europa-sofre-com-incendios-florestais-e-oriente-medio-registra-indice-de-calor-que-pode-matar.ghtml
  10. https://portal.inmet.gov.br/noticias/balan%C3%A7o-chuvas-irregulares-e-altas-temperaturas-marcam-outono-de-2023
  11. https://www.bbc.com/future/article/20230720-theres-a-heatwave-in-the-sea-and-scientists-are-worried)
  12. https://www.rfi.fr/br/europa/20230615-junho-tem-as-temperaturas-m%C3%A9dias-globais-mais-quentes-para-o-m%C3%AAs-j%C3%A1-registradas-alerta-copernicus

Demais fontes de pesquisa: Climate Central, Revista Science, BBC News, Diálogos Diplomáticos, Folha de São Paulo, O Globo.