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Carta da direção 

Não temos dúvida de que este último ano foi o mais produtivo da história do CBC. Chegamos a conduzir, simultaneamente, 18 projetos com o envolvimento de quase 40 colaboradores.

Eu e o William escrevemos estas linhas a menos de 90 dias da COP30, no retorno de mais uma viagem ao Rio Grande do Sul, onde apresentamos os resultados de 9 dos 14 produtos do Plano de Transição Energética Justa das regiões carboníferas. Esse projeto, pela sua complexidade política e pelo tamanho do desafio de tratar do carvão na prática, tem demandado grande parte de nosso tempo e energia.

Vivemos também um período intenso de sobrecarga e realizações. Poucas semanas atrás, organizamos o treinamento presencial do The Climate Reality Project, conduzido por Al Gore, que formou quase 900 novos líderes climáticos no Brasil. Paralelamente, estamos planejando os próximos passos do nosso produto de maior sucesso, lançado em janeiro: o Anuário Estadual de Mudanças Climáticas, já consolidado como uma referência nacional.

Com gratidão por este momento único, compartilhamos nas páginas a seguir um panorama das conquistas e, em maior detalhe ao longo do relatório, a trajetória de um ano verdadeiramente transformador.

A COP30 em Belém será um marco histórico não apenas para o Brasil, mas para o mundo. Pela primeira vez, a Amazônia — coração climático do planeta e território de povos que guardam saberes ancestrais fundamentais à nossa sobrevivência — receberá uma conferência das Nações Unidas. A presidência da COP tem reiterado que este deve ser o encontro da ação, um verdadeiro mutirão da espécie humana para lidar com o enorme desafio das mudanças climáticas. A conferência será também um rito de passagem: transformar a ação climática de uma cacofonia em uma sinfonia, em que todos os países, povos e setores toquem juntos a mesma partitura de futuro.

O evento ocorre em um contexto de urgência sem precedentes. O ano de 2024 foi o mais quente já registrado, com a média global ultrapassando pela primeira vez o limite de 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais. Tragédias como as enchentes devastadoras no Rio Grande do Sul, as secas prolongadas na Amazônia e no Pantanal e os incêndios que consumiram vastas áreas de biomas brasileiros comprovam que o colapso climático já está em curso. Além disso, o país enfrenta o desafio concreto de preparar a infraestrutura e a logística necessárias para receber dezenas de milhares de pessoas em Belém, uma cidade que pela primeira vez será palco de uma conferência internacional dessa magnitude. Transporte, acomodação, saneamento e conectividade digital estão sendo mobilizados pelo governo federal como parte da preparação, pois o êxito dessa COP dependerá não apenas da qualidade das negociações, mas também da capacidade de mostrar ao mundo que o Brasil pode realizar, no coração da Amazônia, um encontro global com excelência. O desafio é enorme.

Enquanto isso, no cenário internacional, guerras e conflitos se multiplicam, o multilateralismo mostra sinais de desgaste e a confiança nas instituições globais se enfraquece. O retorno de Donald Trump à presidência dos EUA, e de uma agenda fossilista, aliada à imposição de tarifas pesadas a países inimigos e aliados, apenas acentua as incertezas. Nesse quadro turbulento, o Brasil se destaca por tentar construir uma narrativa alternativa, capaz de conjugar urgência, justiça e ambição, recolocando-se no centro do debate climático.

O período de 2023/2024 foi, nesse sentido, de renovação profunda da política climática nacional. O governo federal lançou o novo Plano Clima, estruturando pela primeira vez desde 2015 planos setoriais de mitigação, com metas concretas de redução de emissões em energia, indústria, transportes, agropecuária, resíduos, cidades e uso da terra. A nova NDC brasileira, submetida em 2023/24, recuperou o nível de ambição original e o ampliou até 2035, reafirmando a posição estratégica do país no Acordo de Paris. Em paralelo, marcos regulatórios fundamentais foram aprovados: o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), que inaugura o mercado regulado de carbono no Brasil; o Marco Legal do Hidrogênio e a Lei do Combustível do Futuro, que abrem caminho para novos vetores energéticos; o Plano Nacional de Transição Justa (PLANTE), que sistematiza pela primeira vez políticas públicas para enfrentar os impactos socioeconômicos da descarbonização; o Plano de Transição Ecológica, liderado pelo Ministério da Fazenda, articulado ao programa Nova Indústria Brasil, que reposiciona a economia em direção a uma neoindustrialização verde; e a revitalização do Fundo Clima, reforçado por emissões do Tesouro Nacional em títulos sustentáveis no mercado internacional. Esse conjunto de instrumentos forma um marco histórico e dá lastro à credibilidade do Brasil no cenário internacional.

Nesse ambiente, o CBC respondeu com intensidade e resultados concretos. Apoiamo-nos em nossa trajetória para ampliar projetos estratégicos, aprofundar parcerias e consolidar o papel da sociedade civil como ponte entre governos, setor privado, academia e comunidades locais. Lançamos um novo Código de Ética, renovamos nossa certificação internacional de equivalência, promovemos encontros periódicos de integração da equipe e reforçamos compromissos com diversidade e inclusão. Colaboramos com o governo federal na transversalização da Transição Justa no Plano Clima, em parceria com a iniciativa ICAT; aprofundamos, junto ao Climate Investment Funds, a análise dos impactos sociais da expansão das energias renováveis; desenvolvemos em Minas Gerais uma estratégia de financiamento climático e ferramentas de monitoramento em parceria com o UK Pact; e estamos elaborando o Plano de Transição Energética Justa do Rio Grande do Sul, propondo a criação de alternativas econômicas para regiões carboníferas. 

Seguimos fortalecendo o federalismo climático brasileiro, apoiando o Consórcio Brasil Verde e os Governadores pelo Clima em sua atuação conjunta. No plano internacional, reafirmamos nosso protagonismo na COP29 em Baku, organizando painéis, articulando agendas bilaterais e contribuindo para debates sobre financiamento climático e substituição de fósseis, em preparação para o desafio de Belém.

A comunicação e a visibilidade pública também se intensificaram. O CBC esteve presente em cento e quarenta matérias jornalísticas em veículos como GloboNews, Valor Econômico, O Globo, Folha de S. Paulo e Correio Braziliense, alcançando um espaço estimado em quase oitocentos mil reais em mídia espontânea. Esse reconhecimento reflete a credibilidade conquistada e a relevância das análises produzidas, como se evidenciou no destaque dado por André Trigueiro, na GloboNews, ao nosso Anuário Estadual de Mudanças Climáticas.

Assim, mesmo em um ambiente global de crise e incerteza, seguimos crescendo em impacto e relevância. O CBC é hoje um espaço de referência para governos, imprensa, movimentos sociais e investidores que buscam compreender e apoiar a transição climática brasileira. Olhamos para 2025/2026 com clareza de propósito: a COP30 em Belém será um divisor de águas, e nossa missão é garantir que estados, municípios, comunidades locais, juventudes e organizações da sociedade civil estejam no centro desse processo, fazendo do Brasil exemplo de ambição climática justa, inclusiva e enraizada em sua diversidade.

Concluímos este relatório com a convicção de que seguimos avançando com determinação e otimismo. Reafirmamos o espírito de que “temos que fazer o nosso melhor; essa é a nossa sagrada responsabilidade humana”. Mantemos o foco em promover a agenda climática subnacional, a transição justa e a educação climática, sempre movidos pela certeza de que esses caminhos são necessários e inadiáveis.

Ao mesmo tempo, reafirmamos os princípios que orientam a nossa trajetória: o fortalecimento do federalismo climático como diferencial brasileiro; a valorização da ciência, da transparência e do diálogo social como fundamentos para decisões robustas; a formação de novas lideranças, sobretudo entre jovens, comunidades locais e povos indígenas; e a construção de parcerias amplas que conectam governos, sociedade civil, setor privado e comunidade internacional em torno de soluções concretas.

O CBC seguirá atuando como espaço de inovação e cooperação, transformando conhecimento em ação e ambição em resultados. Nosso compromisso é contribuir para que a COP30 em Belém seja, de fato, a COP da ação — e que dela emerja não apenas uma. nova etapa de negociações, mas uma sinfonia de esforços que fortaleça o Brasil e o mundo em sua caminhada rumo a um futuro sustentável, inclusivo e justo.

Guilherme Syrkis, diretor-executivo

William Wills, diretor técnico